Os clientes que procuram o trabalho de consultoria de imagem o fazem, na sua maioria, porque querem sair de algum estado de desconforto. Assim, podemos dizer que a palavra ‘Felicidade’ faz parte de expectativas e benefícios que os clientes encontram neste trabalho. Para entendermos mais sobre ‘Felicidade’ e a relação dela com o trabalho que desenvolvemos, conversamos com Carla Furtado, fundadora do Instituto Feliciência.
- Como você definiria Felicidade?
A felicidade possui infinitas definições, cada pessoa é livre para estabelecer a sua. Como minha atuação é baseada na Psicologia Positiva, ciência que investiga como melhorar a reserva de bem-estar, adoto a seguinte: felicidade é experimentar mais emoções positivas que negativas no dia a dia e, ao mesmo, tempo, reconhecer que a vida do que jeito que é neste exato momento, vale a pena. Ou melhor: reconhecer que a vida é um grande privilégio. Santo Agostinho definiu felicidade de uma maneira linda: é seguir desejando a vida que já se tem.
- Como você entende esse fenômeno de constante “afirmação de uma vida de felicidade” através das mídias sociais (FB, Instagram, Twitter)?
Esta afirmação de uma vida de felicidade nas redes sociais está a serviço de dois sistemas: o de recompensa e o de consumo. Pessoas que parecem felizes obtêm maior aceitação social, mensurada hoje por número de seguidores, likes, compartilhamentos. E isso atinge diretamente o circuito de recompensa no cérebro. E há também uma engrenagem comercial funcionando nas redes sociais: influencers vendem lifestyle permeado por produtos, serviços, marcas – e, claro, precisam parecer felizes. Tudo certo desde que se compreenda que isso não é felicidade. A recompensa e o consumo trazem prazer, e prazer é algo causado por um fator externo que se encerra em si mesmo.
- Você sustenta sua ideia (https://www.linkedin.com/pulse/por-que-sua-felicidade-me-importa-carla-furtado) que preocupar-se com a felicidade deixou de ser algo individualizado, criando exemplos onde a relação direta do trabalho é, hoje, responsabilidade de importantes grupos e cita MIT. Como acredita que eles vão conseguir isto? e em quanto tempo veremos o resultado desse trabalho em nossa vida prática?
Esse não é um tema do futuro, é um tema do presente, é uma realidade emergente. E isso é irremediável, dadas as grandes rupturas apresentadas pelo U.Lab, do MIT: o meio ambiente, a economia e o ser humano não suportarão por muito mais tempo a manutenção de um modelo de crescimento ilimitado, do tipo “custe o que custar”.
A ONU preconiza hoje que as nações signatárias revejam a aplicação do Produto Interno Bruto (PIB) como indicador de progresso. No lugar, sugere a adoção do FIB – Felicidade Interna Bruta, criado pelo Butão. Como o FIB há vários outros sendo desenvolvidos, a Nova Zelândia acaba de anunciar que vai adotar um novo indicador já em 2019, avaliando aspectos econômicos, sociais e ambientais para mensurar seu progresso. França, Inglaterra, Finlândia e cerca de 20 estados americanos já testam novas metodologias, considerando o bem-estar do cidadão.
Da mesma forma, empresas geridas de maneira visionária já consideram a felicidade do trabalhador como um importante ativo – o Hospital Anchieta, em Brasília, tornou-se um case internacional, registrando incrementos em vários KPIs, inclusive na rentabilidade após a implementação do Programa de Felicidade. Cases de sucesso, como esse e o da Zappos, têm estimulado outras empresas a seguir o mesmo caminho.
No âmbito pessoal, isso se reflete na busca pelo propósito, nas transições de carreira que vemos com maior frequência, no nomadismo digital, entre outros fenômenos do nosso tempo. As pessoas começam a buscar mais realização que sucesso.
- “A felicidade é um problema individual. Aqui, nenhum conselho é válido. Cada um deve procurar, por si, tornar-se feliz. “Sigmund Freud
Esta afirmação parece contrariar toda essa nova corrente que acredita na felicidade com forte entendimento no coletivo. O que você diria a esse respeito?]
Sou admiradora do legado de Freud, adepta da psicanálise. Até certo ponto, a citação está correta: do ponto de vista pessoal a felicidade é mesmo uma deliberação, eu decido ser feliz, decido fazer escolhas que melhoram o meu bem-estar. Vale citar que 50% do potencial de felicidade é genético, 10% é circunstancial e 40% está diretamente relacionado ao estilo de vida. Contudo, isto é válido para pessoas que possuem o necessário para viver com dignidade e isso ressalta o caráter social da felicidade. Não é possível dizer a alguém que passa fome ou que sofre violência de qualquer ordem que basta decidir ser feliz.
- Há uma linha de pensamento que defende a ideia de que a felicidade se torna um problema quando se acredita que ela deva ser permanente. e que se não estamos felizes somos menos. A distância deste ideal levaria ao sofrimento e a, consequente, falta de felicidade. Qual sua opinião?
Falar sobre permanência seria desdizer uma das principais características da existência humana que é a impermanência. Mas, a felicidade enquanto estilo de vida pode ser bastante duradoura. Veja que não falo aqui de prazer ou alegria, falo do que citei como conceito ao início: mais emoções positivas que negativas e a certeza de que a vida vale a pena. E como adotar um estilo de vida que fomente a felicidade? Sabemos hoje da importância das relações nutritivas, da atividade física regular e do sono reparador, da meditação e do altruísmo, apenas para citar alguns fatores que potencializam o bem-estar. E sabemos também da plasticidade cerebral, podemos nos tornar mais positivos a manutenção de determinadas práticas, como o caderno da gratidão.
- No livro de Eduardo Gianetti, cujo título é Felicidade. encontramos a seguinte definição; “Ela (a felicidade) é uma atividade…” diante desta afirmação como mantê-la em ação?
Em primeiro lugar, esquecendo a idealização que fizemos da vida e da felicidade. Outro dia uma amiga me disse: “Esta não é a vida que deveria ter com esta idade, esperava mais”. Sim, disse a ela, mas é a vida que você tem aqui e agora. Felicidade só acontece no presente e resulta da forma como se vive, da qualidade das relações, do exercício de um propósito que vá além de si mesmo, de realizações.
- Qual a relação entre o trabalho do Consultor de Imagem e Felicidade?
O consultor de imagem pode exercer um papel primordial na potencialização da felicidade, especialmente quando seu trabalho se inicia com a identificação das forças de seu cliente. Os estudos de psicologia positiva mostram que enfatizar as forças é muito mais impactante no bem-estar que dirimir limitações. Ocorre que ao longo da vida nos perdermos de nós mesmos e o processo de consultoria de imagem pode ser uma oportunidade de reencontro. Bom mesmo é que o cliente encerre o processo de consultoria conectado com suas virtudes e capaz de expressá-las em sua vestimenta, comunicação e comportamento.
Carla Furtado é fundadora do Instituto Feliciência, consultoria brasileira dedicada à promoção do florescimento humano e organizacional, baseada em Psicologia Positiva, Neurociência e Felicidade Interna Bruta (FIB). É membro da International Positive Psychology Association (IPPA) e Facilitadora Master em FIB em formação pela Schumacher College (Inglaterra) e pelo GNH Centre (Butão).
Respostas de 3
Excelente matéria!
Muito bom este post e conseguir em 100% dos casos chegar a conclusão de que: “Bom mesmo é que o cliente encerre o processo de consultoria conectado com suas virtudes e capaz de expressá-las em sua vestimenta, comunicação e comportamento.”, seria um sonho. Grande parte das pessoas estão muitos passos antes do autoconhecimento, valorização pessoal e a priorização do Ser. A supervalorização da parte profissional ainda predomina, isso até pode funcionar no curto e médio prazo, mas no longo prazo não será suficiente para mantermos nossa Felicidade ativada e talvez até tenhamos perdido muito dela no meio do caminho.
Maravihoso