Ao ser selecionada pela AICI para representar a maior associação internacional de consultores de imagem no maior evento de moda do país – O Minas Trend edição 30 –tive uma experiência única: a oportunidade de palestrar para um público criador de moda. Isto proporcionou uma reflexão poderosa, pensar sobre o mercado atual de moda, no como a consultoria de imagem está inserida neste mercado e na relevância que os produtos de moda têm na vida do consumidor.
Cada dia mais existe a procura por consultores de imagem com demandas específicas para palestrar. Isto mostra consolidação da profissão e o lugar que hoje a consultoria de imagem ocupa, além do conhecimento agregado. Mostra o quão o foco no ser humano e no bem-estar vislumbram a visão do futuro e o caminho que a consultoria irá percorrer.
Minha alegria foi tamanha e a preocupação na mesma proporção, afinal o tema a ser abordado de acordo com minhas diretrizes de trabalho: corpo, comportamento e varejo de moda, seria polêmico e delicado. Abordar idéias, fatos, dados técnicos e orientações, sem julgamentos, com informações precisas, para não causar transtornos ou aborrecimentos para quem iria assistir. Nós que cuidamos, avaliamos e lidamos com pessoas diariamente pela nossa profissão nos processos de construção (e reconstrução) da imagem, nos deparamos com várias demandas, questões, que podem ser mais profundas como síndromes e transtornos, logo precisamos ter cuidado, empatia e gentileza para orientar sem melindrar nossos clientes.
Foi incrível representar a AICI e defender a diversidade corporal, e mostrou o quanto o diferente ainda causa impacto! De verdade, causa incômodo e faz com que cada indivíduo pense sobre si, seu corpo e na imagem que o espelho reflete. Mesmo com espectadores que trabalham com imagem, vemos este desconforto, desde o olhar para si bem como para quem atendem. Falar de corpo nos dias de hoje – na própria consultoria de imagem ou varejo de moda – ainda é um tabu. Que aos poucos vem sendo “quebrado” por movimentos que falam de diversidade e aceitação, como body positive, não apenas com o foco da Gordofobia, mas sim trazer consciência corporal, não no sentido em que os corpos não têm falhas ou defeitos, mas sim, focar no que temos de melhor e com uma visão de que podemos sim alterar o que nos incomoda.
Falar da falta de representatividade de corpos diferentes de forma real desperta e fomenta questões, principalmente as que são relacionadas ao marketing de vendas de forma geral. E quando falo da falta de representatividade, falo um pouco de todas as formas de um indivíduo se sentir representado no polo de moda. Isto inclui modelos que representem este indivíduo e seu corpo, designers e estilistas que também façam parte destes grupos, vitrines inclusivas, vendedores e atendentes também com corpos diversos, enfim pessoas que representem a diversidade corporal em toda a cadeia de produção de moda. Muito desagradável, por vezes, entrarmos em uma loja que faz campanha pela diversidade corporal e não nos sentir respeitados desde o atendimento até as peças nas araras das lojas. Onde até nomenclaturas, como petit ou plus, nos colocam à parte e não inclusos de verdade. No passado, trabalhávamos nossos corpos para caberem em peças de roupas, hoje, isto não é mais admissível. Precisamos pensar e trabalhar a diversidade, respeitar os indivíduos e suas características corporais, bem como necessidades. Um dos caminhos para alcançar este objetivo é produzir peças que se adequem aos corpos mais variados.
Palestrei sobre morfologia corporal nos processos de criação e vendas, resumidamente o impacto da diversidade corporal no momento da criação para gerar um aumento significativo nas vendas. Trazer pontos de melhorias no trabalho de moda para de forma criativa, assertiva e diversa, aumentar a procura por determinados produtos e fornecedores e assim, também, aumentar as vendas e os lucros das marcas. Buscando destaque em todo o processo para o humano, foco em conhecer o cliente e não apenas desenvolver produtos. Falar de morfologia para o varejo de moda, é fazer com que os processos de criação de moda e marcas no momento da venda observem seus clientes com atenção, gentileza e empatia, conhecendo bem os consumidores dos seus produtos e cuidando dos seus bens mais preciosos.
A temática mais importante tratada na palestra é a diversidade de corpos e como o varejo de moda em conjunto com a consultoria de imagem podem encontrar soluções na criação de produtos, peças de roupas para aplacar as necessidades de públicos tão esquecidos nas últimas décadas e, assim, aumentar as vendas. Públicos com grandes dificuldades de encontrar peças que se adequem naturalmente no seu corpo, sem ajustes incomuns, que possam ser feitos rapidamente na própria loja. Entender a relação entre corpos e as peças que usam, a conexão e o que estas peças representam de forma genuína para cada indivíduo, é o caminho para soluções eficazes para produzir moda pautada na diversidade trazida por cada corpo humano. Padrão é não ter padrão.
Além deste tema central, conceituei outros subtemas que com igual importância são a base para falarmos sobre corpos, criação e vendas. Para falar com propriedade sobre o diverso, é preciso entender morfologia corporal, biotipo, proporções corporais, bem como movimentos ligados a aceitação corporal – o body positive por exemplo – e assim mostrar desde aspectos biológicos e genéticos até os movimentos de inclusão e suas mudanças no olhar sobre o nosso corpo.
Nosso trabalho vai além de crenças e achismos. Para qualquer trabalho ser bem-sucedido precisamos de estudo, conhecimento, pesquisa e dados técnicos. De acordo com os estudos recentes da ABNT (Associação Brasileira de normas técnicas) – dez/21 – sobre o conceito de vestibilidade e medidas corporais, tabelas de medidas de vestuário (manequins/tamanhos em cm), e a SIZEBR ( pesquisa que embasou os estudos da ABNT) mesmo com toda a diversidade corporal, os corpos das brasileiras estão divididos em 4 biótipos: retângulo, triângulo, ampulheta, triângulo invertido, onde 76% dos corpos observados tinham o corpo tipo retangular, não ampulheta, (formato corporal melhor atendido no mercado) e isso influencia nos padrões de medidas do corpo como busto, cintura, quadril para produzir peças. Vejo biotipos como traços da nossa genética, importante para entendermos que as brasileiras ao contrário do que pensamos não tem um corpo dito “violão” na sua grande maioria, e isso ajuda ao mercado da moda e o varejo a pensar sobre toda sua produção e soluções no vestir, para diminuir o abismo entre formato de peças de roupas e corpos brasileiros. Também vejo o nosso corpo de uma forma mais ampla, nosso corpo carrega estes traços e muitos outros, aliando formato e formas e todas as questões que permeiam este corpo ao longo da vida de cada cliente. Esses traços contam histórias sobre nós. E auxiliam para conhecermos possíveis incômodos e auxiliar este cliente a aceitação do seu corpo. O biotipo é um orientador, uma bússola, que nos leva ao caminho da conscientização e diversidade.
Outro ponto abordado foram os padrões de beleza, algo tão comum com o qual convivemos cotidianamente, de acordo com a atualidade. Entender como estes influenciam o corpo e como isso afeta o “padrão” de beleza corporal individual e dita o comportamento de moda do momento, na produção de peças. Afinal, nosso corpo é social e todo e qualquer movimento ou comportamento seja ele de beleza, moda, política, economia, afeta sim o nosso corpo, e a maneira de enxergá-lo e lidarmos com ele. Ter consciência do corpo inserido na moda, como a moda se posiciona diante das mudanças e da aceitação corporal, quais soluções pensam para melhorar esta relação da moda com os corpos, é fundamental quando falamos de produtos de moda. E uma forma de entender como estas questões surgem, como os padrões se destacam, é necessário entender sobre tendências.
As tendências são as principais fontes para entendermos questões voltadas para moda, beleza, consumo e os reflexos nos movimentos de aceitação corporal. Se manter atento as tendências sejam elas de ordem macro ou micro é de suma importância, pois todo o mercado se baseia nisso para criar produtos para seus clientes, entendendo de verdade necessidades e o que será consumido de acordo com os comportamentos. Não esqueça: diversidade é uma macrotendência e quem se atualiza e estuda o tema com maior profundidade, tende a se destacar e “nadar” no oceano azul da consultoria de imagem.
Para criar peças de roupas que alcancem o público desejado, precisamos estar “antenados”, atualizados sobre o mercado e quem são nossos clientes, como consomem e o que buscam quando procuram uma loja de roupas. Tenha isso mapeado: idade, profissão, estilo pessoal e de vida, gênero, medidas corporais, o que mais consome sua loja, como conheceu a loja, renda mensal, hábitos e hobbies, o quanto costuma gastar em roupas e acessórios, cores prediletas, de que forma gosta de consumir…e entenda porque consomem na sua loja ou marca, o que gostariam de encontrar e consumir na sua marca e um ponto importante: tenha catalogado também quem visitou sua marca ou loja e NÃO consumiu, isso mesmo, procure observar este dado, isso pode salientar muitas questões e desvendar “mistérios” que ajudam no crescimento da sua marca.
E todos estes pontos servem para dar base para tratarmos do ponto alto da palestra, do como o estudo da morfologia para criação e vendas trazem pontos de melhorias que favorecem o varejo de moda. Melhorias sobre a produção de moda, quem produz, quem fornece, lojistas e vendedores, e como orientar sobre a mudança de mindset em relação ao corpo, a ter um olhar sem preconceitos e com mais empatia. Não pensar apenas no produto, mas nas pessoas que o usam. Isso faz a diferença. E ter como resultado, fidelização do cliente, uma importante chave para o crescimento de qualquer negócio de moda. Nota mental: Cliente agradado, é o cliente que é bem tratado, bem cuidado e que encontra na loja que escolheu os produtos que melhor favorecem e aplacam suas necessidades!
E esta fidelização começa nos processos de criação de peças: quando se planeja uma coleção, escolhe-se materiais (conheça bem o material que você trabalha: estude, analise, teste), modelagens, cores para fabricar peças de roupas, e neste momento também é pensado em quem vai vesti-las. Então para os fabricantes de peças, sejam fornecedores de algumas marcas ou as marcas que fabricam suas próprias peças, podem melhorar o processo de criação, se utilizando de inovação e tecnologia para trazer mais precisão a produção. Hoje o mercado dispõe de softwares para desenvolvimento de tecidos, estampas, cores, bem como impressoras 3D, scanners para medição corporal, que detalham o corpo humano nas variadas medidas e auxiliam na construção de peças personalizadas ou melhorar as necessidades do mercado de produção de peças no momento de tentar padronizar. Sem esquecer, de treinamentos constantes das equipes de produção sobre materiais e modelagens, para inclusive poder oferecer produtos produzidos sob demanda ou sob medida.
Algumas marcas mais voltadas para o Slowfashion buscam este entendimento, mas ainda está longe do que desejamos ver, afinal mesmo com movimentos voltados para o corpo diverso, ainda para controlar a produção e os gastos referentes a isso é necessário ter o mínimo de padrão para a produção, mesmo com toda a consciência de que corpos são únicos. A esperança trazida com estas observações nos faz pensar nas questões mais profundas dos nossos clientes e quanto é tão bom entrar em uma loja e ter uma roupa que realmente abrace seus corpos, com medidas que aplacam nossas necessidades, e não se sentir obrigado a vestir o manequim imposto pelo padrão da moda ou da marca onde resolveu comprar, afinal poder vestir o que desejamos é fundamental para nosso bem-estar e autoestima.
Ao conversar com colegas de profissão, para buscar entender as necessidades apontadas por clientes nos processos de consultoria de imagem, uma carência apontada é em relação a fazer compras mais assertivas para seus tipos de corpos. É o não conseguir comprar na loja desejada ou dos sonhos, o que torna a experiência de fazer compras algo frustrante e desgastante. Por mais que as lojas tentem se adequar, ainda estão longe de aplacar todos os corpos. Muitas marcas não têm fabricação próprias e isso as deixam presas aos fornecedores, que não aplacam as necessidades trazidas por seus clientes, impedindo que ela os fidelize. Enquanto a produção/confecção de moda não entender o indivíduo como seu verdadeiro produto, nada vai mudar. Nada adianta criar peças de roupas lindas e não ter pessoas que comprem este produto. E por outro lado ter clientes com renda querendo investir em moda e faltar um produto bom para consumir. Para contornar e melhorar a experiência de alguns clientes podemos indicar modelistas/costureiras e ou alfaiates, mesmo que algumas vezes o serviço seja demorado pela demanda e até mesmo mais caro. Lembrando que isso é uma forma eficaz de auxiliar nossos clientes, porém por vezes não muda o sentimento ou sensação de frustração que os clientes passam quando desejam consumir em lojas, de ter a oportunidade de escolher uma peça e de pronto levar para casa tudo aquilo que idealizou.
Quando a produção está mapeada e planejada, pautada em toda nossa pesquisa de consumo e nas necessidades dos nossos clientes, ter vendas mais assertivas e, claro, aumento nas mesmas é algo natural. Estar atento aos movimentos do mercado de moda, buscar formas de representatividade, vendedores bem treinados, inclusive para lidar com o diverso e ajudar seu cliente a lidar com suas próprias medidas e não com manequins, vai direcionar sua marca para o aumento nas vendas. Lembrem-se: estes comportamentos fidelizam seu cliente e demostram quem é o real produto, o cliente. Cliente agradado e acolhido na loja que escolheu, sempre volta!
Levantar este ponto de focar no humano como o real produto, mostra que a presença da consultoria de imagem no varejo de moda é fundamental. Ajuda a entender o que o cliente deseja consumir e assim ter propostas relevantes para este no mercado de moda.
A consultoria de imagem vem ganhando cada vez mais espaço em eventos de moda e isso é de extremamente importante para o crescimento da nossa profissão. É uma grande mudança de mentalidade e prenúncio de abertura do varejo de moda para incrementarmos o mercado da moda. E mais, a construção de um espaço multidisciplinar onde encontraremos profissionais com os mais diversos conhecimentos, agregando expertises com enfoque em comportamento, imagem corporal, treinamento de pessoas, gestão de negócios, marketing, dentre outros para participar e desenvolver um trabalho específico para o varejo de moda. Isso representa uma oportunidade de mudar paradigmas e expansão do mercado.
A união dos processos de moda com os processos de imagem, são de grande relevância, estabelecem pontes entre produtos (marcas) e pessoas, onde tudo é produzido de pessoas para pessoas, gerando conexões únicas.
Uma observação final, todas estas reflexões só foram possíveis de serem expostas em um grande evento de moda, de proporções nacionais como o Minas Trend, por ser membro e estar representando uma associação forte, que nos traz respaldo, credibilidade, notoriedade e respeito, enfim todo tipo de apoio necessário nos eventos que participamos. Uma instituição que sempre nos incentiva a entender o espaço que ocupamos como profissionais de imagem, elevar e ampliar nosso conhecimento para estarmos sempre com o olhar no futuro, comprometidos com o que desejamos conquistar.
Fontes de pesquisa: ABNT, SIZEBR/SENAI CETIQT
Fotos: site Marlene Mukai, Freepic, Google e Pinterst
Este artigo foi escrito por Karina Antunes
Carioca, 46 anos. Graduada em Psicologia há mais de duas décadas, com ênfase em psicologia da autoimagem e psicologia do vestir. Mentora e estrategista de imagem há 2 anos. Pós-graduada em consultoria guiada pela face – Método Persoona School. Especializada em imagem corporativa, posicionamento de imagem, imagem corporal, autoestima e comportamento. Amplo conhecimento em varejo de moda. Líder núcleo regional Rio de Janeiro AICI desde novembro de 2022. Tem como propósito o lema: Vista-se com intenção.